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Educação Brasileira: da indignação à concretização de mudanças
Gilvan Azevedo*
“(…) A nossa indignação É uma mosca sem asas Não ultrapassa as janelas De nossas casas” (“Indignação”, Skank, 1993)
RESUMO: Este artigo discute a situação atual da educação no Brasil, analisando o que tem sido feito para melhorá-la e propondo possibilidades distintas que fogem das abordagens típicas geralmente propostas, sem deixar de argumentar que há aspectos básicos a resolver ainda. Conclui com uma proposta de adicionar ao currículo das escolas a prática de uma metodologia de resolução criativa de desafios, de maneira colaborativa e inserindo as escolas no mundo à sua volta. Palavras-chave: Política Educacional; educação; inovação; Brasil.
Onde estamos em educação no Brasil? Hoje, reconhecendo alguns avanços e salvo as exceções de praxe e as boas surpresas que vez ou outra surgem nesse imenso País, constatamos uma baixíssima qualidade, que nos deixa em situação vexatória no cenário mundial, com as piores colocações no PISA, caracterizando a falta de habilidades matemáticas e em solução de problemas, bem como a má capacidade de leitura, instrumentos que ajudariam os estudantes a avançar e ampliar as habilidades em outras áreas do conhecimento. Em suma, para onde quer que se olhe ou se analise resultados de índices e testes, a constatação a que se chega é que a nossa educação é, em geral, de péssima qualidade! Claro que ninguém discorda de planos nacionais lançados vez ou outra, porém já passa da hora de mais do que nos indignarmos com “slogans” fabricados e divulgados em tais planos, já que parecem se tratar de meras cartas de intenção, apresentando desejos genéricos e não atacando os empecilhos à melhoria da educação. Na verdade, para além do aumento dos investimentos, o que é bem-vindo mas não suficiente, seria necessário ver a educação como o motor de um projeto de nação. Considerando que diversos especialistas respeitados já apontaram as causas da eterna crise da educação brasileira e de modo a não ficarmos presos numa discussão sem fim, eventualmente embarcando em abordagens duvidosas de alguns teóricos e ideólogos da moda com suas propostas mirabolantes, ou ainda certas correntes “modernas”, que por exemplo exacerbam o papel do professor como “facilitador” ou defendem um construtivismo ingênuo, ousamos sugerir que algumas ações simples poderiam ser testadas, refinadas e validadas em um processo dinâmico e evolutivo. Talvez o que seria mesmo necessário é a desconstrução do ineficiente sistema atual, criando um novo no qual a profissão de professor passasse a ser vista como uma de prestígio, em uma carreira avaliada e recompensada por mérito. Mudanças em áreas estratégicas como educação requereriam uma visão e políticas de longo prazo e não a descontinuidade que se vê nas ações e programas lançados com pompa e circunstância, sem falarmos em equívocos de certas políticas governamentais, que geralmente querem “ampliar” tudo e não viabilizam o essencial, como a formação dos professores e a qualidade das aulas. Infelizmente, precisamos resolver coisas básicas ainda! Assim, nada impediria que se buscasse implementar soluções mais simples, que levassem em conta o que se passa na vida real das escolas. Seria uma mobilização de forças visando melhorá-las na prática. Grandes mudanças podem sim começar em um nível micro e se expandirem depois. Deste modo, um ponto de partida poderia ser reconhecermos que grande parte dos estudantes percebem a literatura, a matemática e algumas outras disciplinas como não significativas para as suas vidas. Há professores despreparados e o ensino é visto como desinteressante, o que aponta oportunidades de modernização curricular e na gestão, além de um foco em catalisar o desejo nas pessoas de aprender a vida inteira, dada a cada vez mais rápida obsolescência do conhecimento e a demanda por uma preparação diferenciada e integral. Além dos conteúdos tradicionais, seria de fundamental importância ganhar uma nova qualidade nos processos do pensar, desenvolvendo habilidades de raciocínio analítico, crítico, criativo e estratégico, de modo a compreender melhor o mundo, fazer conexões e inovar. Assim, os métodos educacionais poderiam ser desenhados para incluírem também, de maneira sistemática e como parte do currículo, outras experiências de aprendizado, por exemplo utilizando-se metodologias de resolução criativa de desafios, de maneira colaborativa. Outras iniciativas poderiam envolver projetos de desenvolvimento de serviços para a sociedade, viagens de aprendizado, práticas sociais e outras possibilidades. Seria como trazer o mundo para a sala de aula e gerar um processo de duas vias em que a sala seria influenciada pelo mundo e, por sua vez, influenciaria o mundo, criando oportunidades para que os estudantes encontrassem a sua voz, em projetos multidisciplinares, mobilizando recursos para resolver um desafio de uma comunidade, de um bairro, ou mesmo da cidade; ou desafios relacionados a grandes temas como sustentabilidade, redução da miséria e quaisquer outros de interesse e que pudessem contribuir para o mundo à sua volta. Os recursos para a implementação de tais projetos poderiam ser buscados e certamente haveria interesse de outros. Na Alemanha, para dar um exemplo, há interação entre colégios e empresas até para aspectos mais simples como o da formatação curricular, o que já é imitado em países asiáticos como Índia e China. O uso de tecnologia (equipamentos como tablets e aplicações como redes sociais, aplicativos, etc.) é outro aspecto a considerar, embora talvez devêssemos vê-lo com certo ceticismo, na medida em que alguns parecem advogar o uso de uma ferramenta como um fim em si ou uma solução milagrosa para a melhoria do ensino. Claro que a tecnologia permitiria a criação de um ambiente de aprendizagem, com informação em tempo real, aprendizado personalizado e a formação de comunidades, porém tudo isso são apenas meios; o desafio está não somente na expansão rápida do acesso, mas no suporte necessário para implementação e treinamento adequado daqueles que estariam lidando com tais projetos nos quais o uso da tecnologia faria uma diferença. Entretanto, não deveríamos deixar de retomarmos uma questão básica: como habilitar os alunos para entenderem o que lêem ou assistem? Esses exemplos de iniciativas e abordagens seriam possibilidades concretas, que poderiam começar pela promoção de oficinas extracurriculares para a prática de um pensar e fazer transformador, em uma jornada facilitada de autodescoberta e construção colaborativa de soluções inéditas, inclusive resolvendo desafios variados e aquele relativo ao próprio sistema educacional, o que aumentaria as chances de implementação de um novo modelo educacional, já que seria um processo de construção coletiva, o que tende a gerar maior engajamento daqueles envolvidos. Porém, antes de tudo e de qualquer coisa, faz-se necessário que nós, brasileiros, pais, professores, alunos, enfim, quase que a população inteira do País nos indignemos com a educação que temos, exijamos uma reforma de base no nosso sistema e façamos algo, mesmo que em um nível micro. “É só pensar e haverá asas”, como disse Albert Einstein. Acrescentemos a essa frase o fazer, mobilizando as forças indignadas para além das janelas e fórmulas “prontas”. © Copyright z2do® 2010 - 2015 - Todos os direitos reservados * Gilvan Azevedo é mestre (M.Sc.) em Engenharia Química pela UNICAMP e mestre (M.A.) em Inovação e Mudança pela York St. John (Inglaterra) e Robert Kennedy College (Suíça), com MBA pela BSP/Rotman School (Canadá) e programas de desenvolvimento executivo na Wharton School (EUA) e IMD (Suíça). Com larga experiência executiva e de consultoria, criou a z2do® (http://z2do.com.br), uma consultoria que trabalha com gestão, estratégia e inovação e que provoca novas maneiras de pensar e fazer. Gilvan provê mentoring e coaching executivo e de carreira, conduz workshops, escreve artigos e faz palestras em temas como pensar criativo e inovador e diversos outros. Ele acredita na educação integrada ao modo de vida e no aprendizado e na prática do pensar criativo e inovador como catalisadores do progresso humano, contribuindo assim para a evolução dos indivíduos e a construção de países melhores. |