LEITURA IMPRESSIONISTA DE FOTOGRAFIA CALEMBURISTA | Imprimir |
Fronteiras Culturais - Artigos

2.  LEITURA IMPRESSIONISTA DE FOTOGRAFIA CALEMBURISTA, por Maria Helena Martins                                                       

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Rua 25 de março (São Paulo) - Paulo D'Alessandro

  

            Sob o impacto da foto acima, tento lê-la conforme as impressões que me provoca.

            São cacos? Pedregulhos são? Correm como rio,  se derramam como lama, invadindo o estreito da rua. Rua? Blocos arquitetônicos ladeando uma enxurrada, em tentativa de contê-la. Mesmo quando encontra um vão, um escape, qual reptil logo ali estanca - um beco, sem saída. Massa amorfa, mal moldada pelos limites de um suposto meio-fio. Dois grandes conjuntos de concreto armado, ferro e vidro em oposição e contraste, firmes, intransponíveis, indiferentes a reflexos. Reflexões? Um olhar mais atento identifica a massa, não sem assombro: é de gente!

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Rua 25 de Março - Autor desconhecido

 

            Já essa outra foto e seu título me conectam à realidade conhecida. A visão prosaica desse cenário-alvo de câmeras fotográficas  registra o maior centro comercial brasileiro a céu aberto. Existe desde meados do século 19, com mascates, atacadistas e varejistas, que hoje também concorrem com barraqueiros e ambulantes - constituem a maior colônia árabe-brasileira.  Todos querem conquistar a crescente freguesia dos sacoleiros, vindos de todo o Brasil e dos países hispano-americanos em busca de mercadorias mais baratas.

                A banalização da fotografia, na era digital (save the selfie!), passou a exigir do fotógrafo de verdade muito mais aprimoramento técnico e realização estética. D'Alessandro, com ousadia redobrada diante dessa realidade, busca novos recursos usando câmeras fotográficas analógicas, com um olhar de estranhamento para o óbvio que fotografa.  Seus espectadores são desafiados diante de uma imagem iconográfica desconstruída (cf. primeira foto vista acima). Pois D'Alessandro, além de obscurecer o já conhecido pelo trato com câmeras convencionais, desenvolve com elas novos processos de elaboração, exigindo do apreciador  mais disponibilidade, conhecimento e/ou bom humor. 

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                Revendo essa foto acima, se percebe que o procedimento do artista  propicia o registro visual de contrastes e confrontos, tanto dos possíveis fragmentos fotografados num continuum quanto dos  recursos utilizados. Trata-se, assim, de uma obra que se faz com coerência técnica e conceitual, resultando daí ambiguidade estética. Afinal, não é isso que se quer da arte? Para o espectador leigo restam dúvidas se está diante de um trabalho digitalizado ou não, se é manipulado intencionalmente ou fruto do acaso, ou ainda, se é um trompe-l'oeil ou sabe-se lá que outros referenciais cabe buscar. Fato é que provoca considerável impacto, tanto o leitor leigo quanto o dito especialista fica longe da indiferença.

Já o autor- artista sintetiza:

 S. PAULO - SP

Sinopse

O projeto S. PAULO - SP desdobra trabalho de mais de 20 anos sobre a cidade de São Paulo. Busca romper com os limites do quadro fotográfico, deslizando parcialmente o negativo. Isso resulta no encadeamento de sobreposições parciais, diluindo a separação entre um fotograma e outro. Tal procedimento registra um processo de trabalho e um panorama da cidade: revela nova arquitetura da fotografia e nova fotografia de S. Paulo.

                                                                   D'Alessandro

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Sobre  D'Alessandro

 

Paulo D’Alessandro nasceu em 1967, em São Paulo, onde vive e trabalha. Teve como mestres em fotografia, Dimitre Lee, Rui Mendes, Mauro Holanda, Marcos Magaldi, com quem iniciou sua carreira de fotógrafo. Antes de seguir para Barcelona (Espanha), em 1991, foi aluno de João Musa, no curso “Controle de Tons” (Escola Focus, 1990). Estudou, então, fotografia na Escuela de Altos Estudios de la Imagen y el Diseño, em Barcelona, onde foram seus professores, entre outros, Manolo Laguillo, Manoel Ubeda, Humberto Rivas, Lola Montserrat, Mariano Zunzunaga. Em 2002, um autorretrato de sua autoria recebeu a Menção Honrosa na 9o Mostra de fotografia Jove-Generalitat de Catalunya. Antes de voltar para o Brasil, foi destacado com o primeiro prêmio na 10a Mostra de Fotografia Jove Generalitat de Catalunya. Já em São Paulo, trabalhou como fotógrafo no jornal NP- Folha de São Paulo, e continuou desenvolvendo seu trabalho autoral dentro das artes plásticas, participando de diversas exposições, tendo também suas obras fotográficas fazendo parte de coleções particulares e públicas, como do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM). Foi muito importante para o desenvolvimento de sua carreira como fotógrafo, a participação em grupos de estudo. Entre eles, destacam-se o Grupo de Estudos de Fotografia (orientador-Eduardo Castanho, Museu da Imagem e do Som, São Paulo, 1994); Grupo de estudos de fotografia (orientador – Eduardo Brandão, Escola 3o Andar, São Paulo, 2007/2001) e Fotogramas (orientador- Joan Fontcuberta, Mês Internacional de fotografia, SESC Pompeia, São Paulo, 1994). Criou, em 1994, juntamente com a fotógrafa Domitilia Coelho, a empresa “Domitilia & D’Alessandro”, que hoje é referência no mercado de fotografia de eventos sociais.