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Élvio Vargas ao poeta Lacy Osório

Beberemos hoje
em taças de bronze
o sangue morno
de tuas palavras.
Teu Jordão corre quieto
no curso lento
de suas águas.
Os braços suspensos dos sarandis
barrancos e a mata ciliar
encomendaram um vento brando
para pentear
as franjas prateadas do teu rio.
Um João de Barro exigiu
pela voz armada do canto
que cessassem os roncos do trator.
Alambrados,taperas e rincões
decretaram um toque de silêncio
todo o latifúndio
amanheceu de prontidão.
Fome suor e capital
trigonometria do invetário social.
As bombas submersas regaram
com pesadas lágrimas agrárias
as tuas espigas, poeta
de luto poesia e flor
solitários postais da querência
cercados pela proletária dor
de tua linguagem.

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(...) Mas o principal para Élvio não reside nessa perfomance. Para ele, o que importa é  o mergulho nas profundezas (às vezes impuras) da existência. Vai à caça de tesouros-obscuros ou resplandescentes - de uma autobiografia que ser quer honesta, e algo estoica.

Notemos que tal atitude de realismo psicológico não dispensa o halo imaginativo que envolve a história, e nossas pequenas histórias individuais.

Armindo Trevisan
(Excerto do estudo do livro" Água do Sonho",  de Élvio Vargas")



A TORRE DO SONO

Vai, Mário, vai assim
deslizando entre os dedos
o vento de vidro da infância.
Vai, contigo o carrilhão
da vida, escoltado
pela fúnebre orquestra dos grilos.
Vai, Mário, vai assim
carregado pela alma de cristal
da tua cidade de brinquedo.
Vai com este jeito infinito
de quem solta moedinhas
no rastro das manhãs.
Vai para Bizâncio
Lá não dormem os pássaros
nem os poemas.
Vai, poeta
a morte é a torre do sono.

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LUZ BOREAL

Vêm de muito longe
as vidas que vivem em mim
na cumplicidade e no pacto
sou nuvem, migalhas de sonho
e pensamento
o sono das Águas
nesse rio invisível do vento.
às vezes, e não são escassas
trago o ritmo
intuição e encantamento.
Sou um estrangeiro
mascate da luz boreal.
É tarde demais
me construíram assim
com este estranho tecido
de sangue, linguagem e paixão
carregado de sóis amedrontados
e luas transitivas.

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ÉLVIO VARGAS nasceu em Alegrete em 14.10.51.Escreve desde os anos sessenta. Publicou dois livros e tem várias participações em mais de 20 antologias,inclusive em Berlim e na Sicilia, além de vários prêmios. Site: http://assisbrasil.org/joao/elvio.htm