Imprimir

                     Discurso de Bruto ( in Júlio César*)                                                                          

                                               

                                                                                                                                                José Francisco Botelho ( tradutor)



                                 Ato III

 

                              CENA II

 

Entra Bruto e depois vai ao púlpito, e também entram Cássio e os Plebeus.

 

PLEBEUS Queremos explicação! Exigimos explicação!

BRUTO      Então, venham comigo e me ouçam, meus irmãos.

Tu, Cássio, vai agora àquela outra rua

E divide os ouvintes em dois grupos.

Quem deseja me ouvir, permaneça comigo;

Quem quiser ouvir Cássio, vá com ele agora.

E públicas razões serão apresentadas

Para a morte de César.

PRIMEIRO PLEBEU    Vou escutar Bruto.

SEGUNDO PLEBEU    Vou com Cássio; e depois compararemos

As falas, separadamente ouvidas.

 

Sai Cássio, com alguns dos Plebeus.

 

TERCEIRO PLEBEU    Silêncio! O nobre Bruto está no púlpito.

BRUTO      Escutem com paciência até o fim.

Romanos, conterrâneos, camaradas, ouçam a minha causa e façam silêncio para que possam ouvir. Acreditem-se por minha honra, e reconheçam minha honra para que possam acreditar. Avaliem-me com sua sabedoria e despertem seu juízo para que possam corretamente julgar. Se houver alguém nesta assembleia, algum zeloso amigo de César, a ele eu assevero que a amizade de Bruto por César não era menor que a sua. Se esse amigo então perguntar por que Bruto se ergueu contra César, esta é a minha resposta: não foi por amar menos a César, mas por amar Roma ainda mais. Preferiam ter César vivo e morrerem como escravos, ou verem César morto e viverem em liberdade? Porque César foi meu amigo, eu o choro; porque ele foi venturoso, eu me alegro; porque ele foi valente, eu o respeito; mas porque ele foi ambicioso, eu o matei. Há lágrimas por sua amizade; alegria por sua fortuna; respeito por sua valentia; e morte por sua ambição. Quem de vocês é tão vil que deseje ser um escravo? Se houver alguém, que fale: a ele eu ofendi. Quem de vocês é tão abrutalhado que não deseje ser um romano? Se houver alguém, que fale: a ele eu ofendi. Quem de vocês é tão abrutalhado que não deseje ser um romano? Se houver alguém, que fale: a ele eu ofendi. Quem de vocês é tão abjeto que não ame o seu país? Se houver alguém, que fale: a ele eu ofendi. Faço uma pausa r aguardo a réplica.

TODOS      Ninguém, Bruto, ninguém.

BRUTO      Então, a ninguém eu ofendi. Não fiz a César mais do que vocês fariam a Bruto. O caso de César está registrado no Capitólio; não foram diminuídas as glórias que o honram, tampouco exagerados os delitos que lhe acarretaram a morte.

 

Entram Marco Antônio e outros, com o corpo de César.

 

Aí vem seu corpo, chorado por Antônio, que, embora não tenha participado em sua execução, receberá o benefício de sua morte, uma posição na república, e quem de vocês não receberá a mesma coisa? Com isso, eu me retiro, pois, assim como golpeei meu melhor amigo pelo bem de Roma, guardo a mesma adaga para mim mesmo, quando a pátria decidir que deseja minha morte.

TODOS      Vive, Bruto, vive!



(Excerto de Júlio César , Shakespeare. Trad.de José Francisco Botelho. Companhia das Letras. 2018.)