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A Trilogia do Gaúcho a Pé, de Cyro Martins, na contemporaneidade:uma obra além de seu tempo - Resumo Dissertativo*  E-mail
Fortuna Crítica - Artigos

 

 Elize Heugel Pires

 


           
A
Trilogia do Gaúcho a Pé, de Cyro Martins, na contemporaneidade:

uma obra além do seu tempo. Esse foi o título escolhido para o texto

dissertativo que é fruto de dois anos de pesquisas, leituras e reflexões acerca

dos três romances que compõem a referida trilogia: Sem rumo (1937), Porteira

fechada (1944) e Estrada nova (1954). A proposta de estudo está voltada

para um olhar contemporâneo sobre as obras, buscando analisar aspectos

inerentes aos dias atuais que já eram abordados pela produção artística de

Cyro Martins em meados do século passado. Seu foco principal se concentra

na recepção dos textos literários em questão por um leitor permeado pelos

fenômenos próprios de um tempo paradoxal, no qual os questionamentos

prevalecem sobre as certezas absolutas e a constituição identitária do sujeito

se mostra multifacetada e fragmentada. Como compreender a leitura desses

romances por esse sujeito inserido no contexto contemporâneo?

Partindo dessas hipóteses, o primeiro passo foi conhecer a atualidade

do local onde o escritor ambientou sua ficção, que, conforme já amplamente

discutido pela crítica literária, denunciava as mazelas sociais de uma população

empobrecida e abandonada à própria sorte. A região da Campanha

sul-riograndense possui peculiaridades que precisavam ser descobertas por

quem desejava analisar a contemporaneidade das obras ficcionais. O relato

dessa pesquisa de campo se encontra publicado no seguinte espaço: Link
Presenciar, escutar, observar, conversar, trocar foram ações que favoreceram esse olhar

contemporâneo sobre a literatura, possibilitando a compreensão da constituição

cultural do sujeito que Cyro Martins ficcionalizou na primeira metade do século

XX.

Buscando o aporte teórico dos Estudos Culturais para argumentar essa

proposta de leitura, revela-se a pluralidade de concepções que caracterizam

o tempo presente. Considerando a proposição de Linda Hutcheon (1991), que

aborda a dominante cultural do pós-modernismo, salientam-se os processos de

globalização. Em virtude disso, são retomadas as perspectivas teóricas de

Otávio Ianni (1997) e Boaventura de Sousa Santos (2005), que propõem um

estudo voltado para as relações culturais, econômicas, políticas e sociais que

se estabelecem no cerne dos processos globalizantes. Santos explora a teoria

da bifurcação para expor seu ponto de vista acerca da ideia de sistema

mundial em transição, multifacetado e composto por constelações de práticas

coletivas. Nesse sentido, Ianni apresenta a metáfora do caleidoscópio para

explicar a trama de elementos que se justapõem nos processos globalizantes.

Ambas convergem, dessa forma, ao propor uma construção rizomática do

conceito de globalização, resgatando, na metáfora filosófica de Deleuze e

Guattari (1995), que pressupõe o fim do poder totalitário, a explicação para as

práticas culturais inter-relacionáveis do mundo pós-moderno.

Ao estabelecer esses pressupostos, é analisada a ideia de unidade nacional

que pode ser questionada a partir de uma concepção de narrativização da

nação, proposta por Hugo Achugar (2006). Assim, é desenvolvida a ideia de

revisão do passado como uma forma de incluir, no presente, o discurso

daqueles que foram silenciados no projeto nacionalista, buscando em Bhabha

(2005) o conceito de povo implicado no processo de construção identitária.

Dessa forma, é apresentada uma perspectiva de construção da cultura

nacional através do discurso de margens e minorias, problematizando o

conceito de identidade do sujeito pós-moderno.

Resgatando a concepção de Stuart Hall (2000), encontra-se a definição de um

sujeito fragmentado que assume identidades contraditórias, alternadas em

diferentes momentos, não sendo um ser único e coerente. Pode-se

compreender, dessa forma, que a construção de uma identidade nacional

voltada para uma homogeneização de seus membros precisa ser problematizada

na contemporaneidade, já que as diferenças precisam ser evidenciadas. Nesse

sentido, Nestor Garcia Canclini (2008) propõe um olhar para as especificidades

da América Latina, abordando suas contradições entre modernidade cultural e

desenvolvimento social e evidenciando os processos de hibridismos culturais.

Perpassando as concepções teóricas que caracterizam a contemporaneidade,

chega-se ao consenso de que, de uma forma ou de outra, todas utilizam o

passado repensado, reavaliado ou problematizado. Com isso, busca-se em

Beatriz Sarlo (2007) o pressuposto da guinada subjetiva para dar voz aos que

foram historicamente silenciados e possibilitar a reescrita da história num

movimento de baixo para cima. Assim, os testemunhos e os relatos orais

coletados durante a pesquisa na região da Campanha sul-riograndense

possibilitam a lembrança e o entendimento, como forma de recuperar o

passado. A literatura de Cyro Martins pode representar uma forma de dar voz

aos excluídos pelo discurso histórico oficial, evidenciando a problematização de

questões que ultrapassam seus limites da época de produção.

A partir dessa contextualização do tempo presente, apresenta-se a análise da

trilogia com base no aporte teórico relacionado. O primeiro romance, Sem

rumo, é abordado sob o ponto de vista da identidade cultural no Rio Grande

do Sul, problematizando as construções enraizadas na tradição de um discurso

nacionalista. Por meio da recuperação das concepções teóricas de Achugar,

Bhabha e Hall é analisada a criação de Cyro Martins que permite encontrar nas

personagens elementos que podem estar, de certa forma, associados ao

paradoxo identitário da pós-modernidade. Essa análise está focada nas

construções próprias da linguagem literária que permitem revelar ao leitor um

ponto de vista alternativo ao discurso histórico predominante na época,

desmontando a imagem do gaúcho calcada na tradição.

Porteira fechada, segundo romance da trilogia, é analisado a partir do

movimento migratório que representa o conflito da narrativa. Assim,

levantam-se os conceitos de diáspora cultural (Hall, 2003) e entre-lugar,

desterritorialização e reterritorialização (Bhabha 2005) para analisar os

meandros da construção ficcional que apresenta um gaúcho marginalizado e

sem perspectivas futuras. As angústias de um período em transformação são

evidenciadas através do suicídio da personagem central e da impossibilidade de

reversão da situação conflitante que o choque entre a cultura rural e urbana

produz no restante das personagens. A literatura, a partir dessa análise,

possibilita uma versão alternativa acerca processo de identificação cultural

sul-riograndense, enfatizando um sujeito marginalizado e despossuído de

qualquer tipo de assistência social ou moral.

Por fim, o romance Estrada nova, última publicação que compõe a Trilogia do

Gaúcho a Pé, é analisado sob a perspectiva dos processos globalizantes que

moldam a identidade cultural do sujeito ficcionalizado por Cyro Martins.

Recuperando o aporte teórico acerca das globalizações, são utilizadas as

considerações de Ianni (1997), Canclini (2008) e a metáfora filosófica

deleuziana sobre raiz e rizoma para mergulhar no processo criador que dá vida

a personagens, que representam os sujeitos implicados nesse contexto em

transição.

Ao finalizar a abordagem dos romances da Trilogia do Gaúcho a Pé numa

perspectiva contemporânea, o estudo propõe a justificativa das hipóteses

que revelam a atualidade das obras. Para compreender sua contemporaneidade,

são utilizados os relatos orais, apoiados na concepção de guinada subjetiva de

Sarlo (2007), que estabelecem um diálogo com a proposta da literatura e dos

estudos teóricos. Assim, a ficção pode representar um olhar para o passado, a

fim de problematizar o tempo presente e suas vicissitudes. Pretende-se, assim,

contribuir para a constituição de novos olhares e interpretações de uma

produção ficcional que ultrapassou os limites de seu tempo e que pode

continuar sendo lida e estudada por gerações diversas. Além disso, a pesquisa

também pretende colaborar para que a memória do escritor e psicanalista

Cyro Martins permaneça viva, enfatizando que sua produção intelectual e

ficcional ainda pode ser explorada, para que seja possível um diálogo com

novas concepções e formas de compreensão do mundo.

 

REFERÊNCIAS:

 

ACHUGAR, Hugo. Planetas sem boca: Escritos efêmeros sobre arte, cultura e

literatura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.

 

APPEL, Carlos Jorge. As coxilhas sem monarca. Autores gaúchos:

Cyro Martins. IEL, n 1, Porto Alegre, 1983. p.19 – 28.

 

 

BERND, Zilá. Porteira fechada, um romance amargo e pessimista. In: KETZER,

Solange Medina. MOREIRA, Maria Eunice. MARTINS, Maria Helena (Orgs).

Múltiplas leituras: ensaios sobre Cyro Martins. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.

p. 143 – 150.

 

 

BORGES, Jorge Luis. Discussão (1932). São Paulo: Companhia das Letras,

2008.

 

 

ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas. Reflexões sobre a origem e

difusão do nacionalismo. São Paulo: editora Companhia das Letras, 2008.

 

 

BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005

 

 

CANCLINI, Nestor García. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da

modernidade. 4 ed. São Paulo – EDUSP, 2008.

 

 

CHIAPPINI, Ligia; MARTINS, Maria Helena; PESAVENTO, Sandra Jatahy.

Pampa e cultura: de Fierro a Netto. Porto Alegre: Editora UFRGS/ Instituto

Estadual do Livro, 2004.

 

 

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs. Capitalismo e esquizofrenia. V.1.

São Paulo: Editora 34, 1995.

 

 

GRANDI, Celito De. SILVEIRA, Núbia. Cyro Martins. 100 anos: o homem e seus

paradoxos. Cachoeira do Sul: Defender, 2008.

 

 

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 4 ed. Rio de

Janeiro: DP&A, 2000.

 

 

__________ Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte:

Editora UFMG, 2003.

 

 

HUTCHEON, Linda. Poética do pós-modernismo. História, teoria, ficção. Rio

de Janeiro: editora Imago, 1991.

 

 

IANNI, Octavio. A era do globalismo. 3ª Ed. Rio de Janeiro: editora Civilização

Brasileira, 1997.

 

 

JAMESON, Fredric. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio.

2ª ed. São Paulo: Ática, 1997.

 

 

KETZER, Solange Medina. A narrativa de Cyro Martins: uma história em

trilogia. Dissertação (Mestrado em Teoria Literária) Faculdade de Letras.

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1991.

 

 

MARTINS, Maria Helena (Org.).Cyro Martins 90 anos. Porto Alegre: CELPCyro

Martins/ IEL/ CORAG, 1999. 

 

________ Pagos, passagens, incertezas... o drama da fronteira. In: _______.

Fronteiras culturais. Brasil. Uruguai. Argentina. Porto Alegre: Ateliê Editorial,

2002.

 

 

MARTINS, Cyro. Sem rumo. Porto Alegre: Território das Artes/ CORAG, 2008.

 

 

________ Porteira Fechada. Porto Alegre: Território das Artes/ CORAG, 2008.

 

 

________ Estrada nova. Porto Alegre: Território das Artes/ CORAG, 2008.

 

 

________Visão crítica do regionalismo. Porto Alegre, 1944. Disponível em: <http://www.celpcyro.org.br/v4/Estante_Autor/visaoCriticaRelionalismo.htm>.

Último acesso em: 30 de junho de 2010.

 

 

________ SLAVUTZKI, Abrão. Para início de conversa. Porto Alegre:

Movimento, 1990.

 

 

PESAVENTO, Sandra Jatahy. A representação ficcional do Rio Grande do

Sul na obra de Cyro Martins. Disponível em:

<http://www.celpcyro.org.br/v4/Fronteiras_Culturais/represFiccional_RS.htm>.

Último acesso em: 26 de agosto de 2010.

 

 

SANTOS, Boaventura de Sousa. Os processos da globalização. In: _______.

A globalização e as ciências sociais. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2005.

p. 25 – 94.

 

 

_______ A gramática do tempo: para uma nova cultura política. 2 ed. São

Paulo: Cortez, 2008.

 

 

SARLO, Beatriz. Tempo passado. Cultura da memória e guinada subjetiva. Belo

Horizonte: Editora UFMG, 2007.

 

 

_______ Modernidade periférica. Buenos Aires 1920 e 1930. São Paulo:

editora Cosac Naify, 2010.

 

STEIN, Ernildo. A trilogia do gaúcho a pé de Cyro Martins (Revolução da

literatura menor no seio da grande literatura). In: KETZER, Solange Medina.

MOREIRA, Maria Eunice. MARTINS, Maria Helena (Orgs). Múltiplas leituras:

ensaios sobre Cyro Martins. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008. p. 51 – 62.

 

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 Disserrtação de Mestrado

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS
Faculdade de Letras
Programa de Pós-graduação - PPGL
 Data defesa: 06 de janeiro de 2011
Título: A Trilogia do Gaúcho a Pé, de Cyro Martins, na contemporaneidade:

uma obra além do seu tempo

Mestranda: Elize Huegel Pires

Composição da banca avaliadora:
Professora Drª Maria Tereza Amodeo (presidente - PUCRS)
Professora Drª Zilá Bernd (UFRGS)
Professor Dr Ricardo Araújo Barberena (PUCRS)