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LINGUAGEM LITERÁRIA E LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA | Imprimir |  E-mail

José Onofre


Essa é uma história muito antiga, que já causou discussões de todos os tipos e continuará causando: a adaptação de um livro de ficção para o cinema. A contradição é de que há ótimos livros que deram maus filmes e best-sellers que acabaram em bons filmes. Num segundo ponto, é comum alguém, que leu o livro e depois viu o filme, reclamar do desaparecimento de personagens e situações que eram vitais para desenvolver a história. Não importa, nesta situação, a qualidade do livro ou do filme. Importa que na passagem da palavra para a imagem houve uma alteração, seja pelo corte ou pela adição de personagens e acontecimentos. E o responsável por essa mudança tanto pode ser o produtor como o diretor ou o roteirista. Mas o motivo para a modificação é anterior a eles, o motivo é a relação singular entre palavra e imagem, enfim, a substancial passagem de uma linguagem para outra.

Num livro, o escritor dispõe de um espaço para definir um personagem ou um clima que ele mesmo estabelece. Ele pode mergulhar nos sentimentos mais íntimos de uma de suas criaturas ou exibi-los, de longe, como se olhasse por um microscópio num laboratório, sem se contaminar. Ele pode descrever uma casa em detalhes, objeto a objeto. Sua liberdade é a de prender o leitor, hipnotizá-lo no texto, fazendo-o usar a imaginação que lhe permite, lendo, andar pelas ruas, fazer compras, matar alguém, navegar por mares nunca vistos, tudo isso apenas com a palavra literária.

No cinema, um diretor lida com elementos diversos para reuni-los em seu filme: a história, o roteiro, a escolha e a direção de atores, a fotografia, a música e a palavra que vão aparecer nos diálogos. Mas a sua maior dificuldade não é ter de trabalhar com uma equipe de dezenas de pessoas. Sua principal dificuldade é que ele tem de partir do exterior, das aparências, para mostrar ao espectador quem são as pessoas, o que fazem, como estão se sentindo. Para isso ele precisa lidar com objetos e espaços que passem a significar alguma coisa singular. Uma cidade, uma rua, uma casa, seus móveis, seus quadros e fotografias, o que se chama, em conjunto, de cenário, é o mundo dos personagens. Poderá ser uma cidade do interior, preguiçosa e conservadora, ou Nova York. Nesse espaço o diretor situa seus personagens, que igualmente começaram a ser definidos pelo seus exterior: aparência, roupas, onde mora, etc. Não podendo filmar os pensamentos e sentimentos de alguém, o diretor dependerá de sua expressão corporal, de seus gestos, olhares, suas posturas e, claro, de suas frases.

Ao adaptar um livro para o cinema, ninguém poderá fazer isso de forma literal. A incompatibilidade das linguagens leva a uma alteração de seqüências e personagens para chegar ao mesmo clima do romance. Teoricamente esta é a idéia da adaptação. Mas quase nunca é obtida. E mais: na maioria das vezes é evitada. Basta que a visão do diretor sobre o assunto do livro seja diferente da do escritor para se ter um filme que não trata de se construir em torno do romancista, mas do esqueleto de sua obra. Estas são as diferenças básicas entre o livro e sua adaptação ao cinema: as linguagens são diferentes e os autores são diferentes. Haverá sempre duas obras: o livro e o filme.

O escritor norte-americano Norman Mailer escreveu um livro, traduzido duas vezes no Brasil com títulos diferentes: "Os Machões não dançam" e "Homem que é Homem não Dança". Ele resolveu fazer um filme sobre o livro. Temos aí um caso raro: Mailer escreveu o romance, escreveu o roteiro, escolheu os atores, os locais de filmagem e dirigiu o filme. Ele precisou alterar várias coisas do livro para fazer o filme.

Então, não há como adaptar um livro para o cinema de forma que a identidade entre os dois seja total. Uma coisa boa de fazer é ler o livro, antes de ver o filme, e imaginar como determinado trecho de reflexão silenciosa de um personagem será resolvido na tela. Visto o filme, fazer uma passagem pelo livro para observar as diferenças. Aí se verá se o diretor do filme foi fiel ao espírito do livro ou apenas se aproveitou dele para fazer sua própria história.


José Onofre
é Jornalista e Crítico Literário