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O Humanismo Médico e a Relação Médico-Paciente | Imprimir |  E-mail
Humanismo Médico - Artigos



                                                                                                                             Walmor Piccinini



A partir de uma reportagem da Revista GALILEU de junho de 2018, sobre Relação médico-paciente, minha querida amiga Maria Helena Martins me joga no colo um pedido para que eu escreva sobre esta relação para o CELPCYRO. Este assunto precisa de um livro, aliás, já organizado por Cyro Martins(http://www.celpcyro.org.br/joomla/index.php?option=com_content&;view=article&Itemid=56&id=277 ) e que resultou no primeiro livro editado pela Artmed, editora que orgulha Porto Alegre ( cf. Perspectivas da Relação Médico-Paciente - 1979 ( Ed. Artes Médicas) .

Muitos outros médicos escreveram sobre o assunto, dos mais recentes tenho lido excelentes artigos do Flávio Kanter e da nossa grande estrela de humanismo médico José Camargo. Não é por acaso que eles andem pela casa dos 70 anos. São vividos, experientes e já passaram por muita coisa na nossa profissão. Antes deles podemos lembrar o Cyro Martins e o Moacyr Scliar e muitos outros que seria fastidioso citar neste momento. Todos partem de uma medicina de poucos recursos e estão vivenciando uma nova medicina com propostas muito criativas no trato da pessoa enferma. O que mudou? Na minha visão foi que a relação médico-paciente deixou de acontecer apenas entre os dois e passou a ter muitos personagens, alguns visíveis, outros ocultos. Quando o médico examina um paciente ele sabe que, além do mesmo ele tem a sombra de um plano de saúde, de um advogado, de um jornalista, da família e até do vizinho curioso. Recentemente iniciou-se uma discussão se o paciente pode registrar o atendimento numa gravação, num filme. O médico passou a ser visto como um pato a ser depenado, felizmente por uma minoria de (im)pacientes. Nós médicos temos culpa no que está acontecendo? Acho que sim. Há um endurecimento nas relações, uma impessoalidade, uma fixação na técnica pura e simples, sem levar em conta o sofrimento, a angústia de quem está na nossa frente. Como introdução vou transcrever dois artigos pertinentes ao que estamos tratando. Sou Editor da Psychiatry Online Brasil e publicamos em 2002 um artigo de um médico mineiro -Marcio de Vasconcellos Pinheiro - que fez toda uma carreira nos Estados Unidos da América e voltou para sua terra Belo Horizonte onde trabalhou até sua morte há dois anos.

A Medicina que eu conheci *

Marcio de Vasconcellos Pinheiro
- Médico, psiquiatra e psicanalista. Diretor clínico da Central Psíquica Ltda. (CEPSI) em Belo Horizonte e trabalha também em seu consultório 

Com certo desgosto, quem sabe até mesmo indignação, assisto meio impotente à agonia da Medicina tal como eu a conheci. Apesar de ainda ter as mesmas motivações, se eu hoje tivesse de escolher uma profissão talvez não a escolhesse mais. Do mesmo modo, não mais aconselho a um jovem idealista seguir essa nobre profissão que hoje está sendo tão desrespeitada, invadida, a ponto que se tornou irreconhecível no meio de tantos interesses poderosos que pouco têm a ver com o atendimento de pessoas enfermas.

Já sei que, como médico, quando protesto contra o lugar que me está sendo reservado no atual sistema de saúde brasileiro, corro o risco de ser taxado de ganancioso, gastador e até mesmo desonesto, um profissional que precisa ser gerenciado por homens de negócios "bem intencionados" que se anunciam como protetores dos meus pacientes. Conheço bem essa orquestrada cantiga que visa me calar quando, sufocado, grito por socorro. Ela vem dos investidores na saúde que desviam para si o dinheiro suado dos cidadãos, que naturalmente têm medo de precisar de um médico ou hospital e não poderem pagar.

Esses empresários da saúde que vêm ganhando essa batalha política querem agora ganhar a opinião pública para que o sistema se perpetue gerando seus lucros, dividendos e altos salários. Com o apoio do governo brasileiro, quem sabe pressionado por entidades internacionais, eles "tomaram conta" da saúde no Brasil.

Ainda bem que esse sistema de saúde que vem sendo adotado no Brasil (uma colcha de retalhos com as Unimeds, Planos, Seguros e autogestões), não é o mais prevalente no mundo. Apesar disso não ser muito divulgado, ele está sendo instalado somente nos Estados Unidos e em países do terceiro mundo, onde empresas norte-americanas e locais se unem em "joint ventures". Se compararmos esse sistema com os de outros países como o Canadá, Inglaterra, França, Alemanha e Suécia, concluiremos que ele é o mais perverso de todos - para médicos e pacientes.

O sistema canadense, por exemplo, é um modelo universal e eficiente lá chamado de Medicare que funciona há mais de 40 anos e atende à saúde de toda a população desde os mais ricos aos mais pobres. Por atender a todos, o sistema funciona bem por pressão popular, como ocorre numa democracia. É um sistema descentralizado onde cada província tem uma certa autonomia para lidar com o dinheiro da saúde que lhe é repassado. Elas negociam com as Associações Médicas os honorários médicos e os tratamentos oferecidos. É bom frisar que os médicos e hospitais canadenses são agentes particulares, escolhidos livremente pelos cidadãos em resposta aos seus bons serviços prestados. Cada canadense tem a sua carteira saúde e com ela a liberdade de procurar o médico e o hospital que lhe convier, na hora aflitiva da doença.

É fácil entender porque o atual sistema de saúde se instalou com tanta facilidade no Brasil. O governo não quer gastar com a Saúde e quer aliviar o orçamento do SUS. O aparecimento dessas empresas reduz esses gastos. O cidadão, que já está contribuindo com seus impostos para a Saúde Pública, fica apavorado frente ao atendimento insatisfatório que dela recebe, e passa a contribuir duas vezes: os impostos e mais os prêmios dos seguros-saúde. Forma-se então um círculo vicioso. Se o SUS fosse minimamente adequado, as pessoas não sentiriam a necessidade dos planos e seguros saúde. Já pensou quem iria comprar esses planos se o SUS oferecesse um bom atendimento? Assim, para garantir o mercado para as empresas de saúde, é necessário que o atendimento do SUS permaneça desmoralizado. No "Estado de Minas" do dia 26 de março de 2002, uma carta do leitor Hélvio F. Moreira termina assim: "Entra e sai governo, independentemente de partidos, o descaso com a saúde da população continua, assim como a lógica do sistema: quem tem dinheiro que pague um plano de saúde; quem não tem que se vire para ser atendido". Isso é um fato notório, clamor popular em todo o País!

O sistema instalado no Brasil representa a promessa do fim da Medicina tal como eu a conheci. Investidores, chefe-executivo e administradores coletam o dinheiro das prestações mensais e tomam decisões sobre o seu uso ou não para atendimentos médicos, por eles chamados de "perdas médicas". É fácil compreender que o sucesso dessas empresas irá depender da economia nas suas "perdas médicas", isso é, honorários médicos e tratamentos. Quanto maior for um, menor será o outro. Não é uma lógica perversa?

Daí para frente começa o pesadelo para médicos e pacientes, tudo sob uma bem engendrada cobertura legal. Os médicos passam a ter um novo patrão que determina - a seu bel prazer - quanto valem os seus serviços e o que ele pode e não fazer pelos seus pacientes. Apenas como um exemplo: outro dia, um cirurgião amigo meu me contou como recentemente ele quis internar um paciente seu em condições precárias de saúde, dois dias antes de uma cirurgia programada para as devidas preparações preventivas. De um outro Estado, veio a ordem de um auditor – que nunca viu o paciente – dizendo que isso não seria pago.

O sistema foi tão bem engendrado que os médicos "credenciados" têm tido negado o seu direito elementar de negociar coletivamente com as empresas os seus honorários, condições de trabalho e tratamentos oferecidos. Eles não são considerados empregados e sim profissionais liberais autônomos, "credenciados", e estão sendo enquadrados em leis anti-cartel.

Num sistema neoliberal como o nosso, que depende do equilíbrio de forças e interesses, o fato dos médicos estarem sem representação gera desequilíbrio para o lado das empresas, sem que haja um contraponto que os represente. E os pacientes-usuários perdem muito como isso!

Até mesmo nos Estados Unidos, modelo do nosso atual sistema, Projetos de Lei já estão sendo propostos para corrigir essa injustiça. Além da Lei dos Direitos dos Pacientes, que está para ser votada, a lei Campbell-Conyers (HR 1304) que isenta os médicos que atendem pacientes dessas empresas das leis anti-cartel foi aprovada no ano passado na Câmara Federal, mas morreu no Senado. Esse Projeto permitiria que os médicos negociassem em bloco não só os seus honorários, mas também e mais importante, as suas condições de trabalho. Esse ano já existe outro projeto lei, o "Health Care Antitruste Improvements Act of 2002" que se empenha em permitir a mesma coisa.

 

Fórmulas perversas foram inventadas para forçar os médicos a oferecer tratamentos inadequados. Uma delas é a chamada "capitação" onde o médico recebe uma quantia fixa por segurado e daí para frente todos os gastos com a saúde dos mesmos correm por sua conta. Já pensaram um médico colocado numa situação onde o dinheiro que ele leva para casa é o que sobra depois de pagos todos os tratamentos por ele recomendados? Outro, um pouco mais sutil, atrela o honorário do médico aos exames de laboratório, quanto mais exames ele pede menor honorários ele recebe. E assim por diante.

Muitos médicos estão aceitando essas precárias condições de trabalho porque o seu número está aumentando cada vez mais com a instalação de mais Escolas de Medicina, nem sempre de boa qualidade, no país.

As consequências desse atual sistema de saúde no Brasil são péssimas e óbvias. Podemos prever que a qualidade dos nossos médicos irá deteriorar significativamente nos próximos anos. Quem vai querer ter honorários vis decididos unilateralmente por empresas de saúde? Quem vai querer fazer atendimentos em condições de trabalho precárias, aumentando os riscos de erros médicos?

A distância entre o que seriam atendimentos médicos adequados e as condições de trabalho impostas por essas empresas vai aumentando cada vez mais, apesar das boas intenções do governo de regular o mercado. Se os médicos não tiverem o direito de negociar com as empresas, o sistema irá permanecer desequilibrado com sérios prejuízos para os médicos e seus pacientes.

Alarmado ao ver a minha profissão desaparecer no meio de interesses completamente alheios às nossas motivações, fico desejando que esse desequilíbrio seja corrigido por nossos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, para o beneficio de nossa cidadania - como um todo.

Se isso não for feito logo, estaremos caminhando para um desastre no atendimento à saúde do povo brasileiro.

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* http://www.polbr.med.br/ano02/artigo0602.php - Junho de 2002 - Vol.7 - Nº 6)

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“Hyposkillia”: Deficiência de Habilidades Clínicas *

                                                                                   Dr. Herbert L. Fred, Professor

- Médico do Departamento de Medicina Interna, Centro de Ciências de Saúde da University of Texas, Houston (USA).        

A profissão médica enfrenta hoje muitos problemas. Estamos sendo orientados pela burocracia, perdemos nossa autonomia, nosso prestígio tem espiralado para baixo e nosso profissionalismo está esmorecendo.¹-² Mas nossos problemas não terminam aqui.

Esconder-se na sombra desses males é mais uma doença, pela qual somos os únicos responsáveis, e que põe em perigo o público que atendemos. Ela começa na faculdade de medicina, onde quase nunca recebe a atenção que merece. Durante a residência, continua sendo fácil de detectar, mas os esforços para isso não são rotina. E, mesmo quando se torna notável, as medidas para corrigi-la são muitas vezes ignoradas, inadequadas ou, na melhor das hipóteses, temporárias.

 

Chamo essa doença de Hyposkillia - deficiência das habilidades clínicas. Por definição, os que são acometidos por ela estão mal equipados para prestar um bom atendimento ao paciente. No entanto, programas de treinamento de residência em todos os Estados Unidos estão formando um número cada vez maior desses “hiposkilliacos” - médicos que não conseguem fazer uma anamnese adequada, não conseguem realizar um exame físico confiável, não conseguem avaliar criticamente as informações que obtêm, não conseguem criar um plano de tratamento consistente, têm pouco poder de raciocínio e comunicam-se de maneira precária. Além disso, eles raramente despendem tempo suficiente para conhecer seus pacientes “completamente”. ³ E pelo fato de serem rápidos para tratar a todos, não aprendem nada sobre a história natural da doença.

 

Esses indivíduos, no entanto, tornam-se proficientes em várias coisas. Eles aprendem a solicitar todos os tipos de exames e procedimentos – mas nem sempre sabem quando solicitar ou como interpretá-los. Eles também aprendem a jogar o jogo dos números 4 – tratando um número ou algum outro tipo de resultado de exame em vez de tratar o paciente a quem o número ou resultado do exame pertence. E usando tantos exames e procedimentos sofisticados, inevitavelmente e involuntariamente adquirem uma mentalidade orientada para o laboratório ao invés de orientada para o paciente. A propósito, contribuem com essa mentalidade as organizações de manutenção da saúde que forçam os médicos a atender um número máximo de pacientes, em um número mínimo de minutos, pelo menor número de dólares.

 

O problema da deficiência das habilidades clínicas é longo e generalizado. 5-16 Sua causa, no entanto, é evidente - treinamento deficiente. E a culpa, é claro, recai sobre nós, os professores. Por que, então, permitimos que tais deficiências se desenvolvam, persistam e cresçam? A resposta, acredito, tem dois lados.

 

Primeiro, os valores e prioridades globais da sociedade não são o que costumavam ser. Por exemplo, quando fiz meu treinamento em meados de 1950, trabalho árduo, orgulho de si, devoção ao dever, responsabilidade rigorosa e a busca pela excelência eram as normas. Hoje, no entanto, a ênfase está nas horas de trabalho limitadas, em busca por ganhos pessoais e focados no politicamente correto. Orgulho e (especialmente) responsabilidade quase desapareceram. Consequentemente, as pessoas em todos os níveis - incluindo muitos estudantes de medicina, recém-formados e membros do corpo docente – estão satisfeitas com a mediocridade, a única norma que conhecem.

 

A segunda parte da minha resposta diz respeito ao treinamento que os professores em si recebem. A maioria dos professores de medicina de hoje foi treinada após o início da década de 1970 – época em que a tecnologia médica moderna começou a florescer. A medicina high-tech (de alta tecnologia) é tudo que eles já viram, a qual todos conhecem e, portanto, todos podem ensinar. Sem culpa própria, eles não têm nenhuma ideia real da medicina high-touch (de alto toque).

 

O que quero dizer com medicina high-touch? Refiro-me à medicina baseada em uma anamnese cuidadosamente construída, atrelada a um exame físico pertinente e avaliação crítica das informações então obtidas. Em seguida, determina-se que exames, se houver, são indicados. E se os exames forem considerados necessários, os mais simples são solicitados primeiro. Em comparação, a medicina high-tech essencialmente ignora a anamnese e o exame físico e, primariamente com base na queixa principal, vai diretamente a uma série de exames que tipicamente incluem imagens de ressonância magnética ou tomografia computadorizada, ou ambos.

 

Outro ponto é importante. Ao ignorar ou abreviar a anamnese e o exame físico, a abordagem high-tech enfraquece o vínculo paciente-médico - ou impede que ele se forme. A abordagem high-touch, em contrapartida, representa a apoteose da medicina Osleriana, que garante que tratemos o paciente, não a doença.

 

A conclusão é: embora a tecnologia médica moderna tenha aumentado muito a nossa capacidade de diagnóstico e tratamento da doença, ela também promoveu a preguiça – especialmente a preguiça mental – entre muitos médicos. A confiança habitual em aparelhos médicos sofisticados para o diagnóstico impede que os médicos usem a máquina mais sofisticada e intrincada que sempre tiveram – o cérebro.

 

Existe uma cura para essa tirania da tecnologia? Qualquer cura seria muito difícil porque, no mínimo, iria exigir uma renovação total do corpo docente de nossas faculdades de medicina. Atualmente, esse corpo docente consiste, em grande parte, em dois grupos: fellows e instrutores jovens que têm muitos fatos, mas pouca experiência, e professores mais velhos que são proficientes em apenas um estreito segmento de sua especialidade. Ambos os grupos passam a maior parte de seu tempo dando palestras, escrevendo artigos, trabalhando nas clínicas ou laboratório, ou viajando para reuniões. Essas atividades, sejam elas determinadas pela faculdade ou autoimpostas, limitam o contato entre o corpo docente e os estudantes. E mandados recentes que limitam o tempo de trabalho do residente reduz ainda mais esse contato. O ensino que existe ocorre principalmente na sala de palestras, sala de conferências ou no corredor fora do quarto do paciente, e não à beira do leito do paciente. Estudantes e recém-formados acabam gastando mais e mais tempo participando de palestras ou conferências e cada vez menos tempo atendendo seus pacientes. Com acesso limitado ao corpo docente, os treinandos voltam-se para os recém-formados e para os colegas que estão um a dois anos à sua frente para buscar orientação – uma situação que eu considero “o cego conduzindo o cego”.

 

O que precisamos para aliviar e reverter potencialmente esta tendência? Em primeiro lugar, precisamos de professores que reconheçam que, apesar do espectro dos comitês de revisão da residência, nosso trabalho é educar, não amansar, nossos treinandos.

 

Isso posto, precisamos de mais professores que conheçam e compreendam a fisiopatologia, manifestações clínicas e história natural das doenças; professores que saibam que exames, se houver, devem ser solicitados, quando solicitá-los e como interpretá-los; e professores que usem a tecnologia avançada para verificar e não formular suas impressões clínicas.

 

Precisamos de professores que realmente compreendam o valor de uma boa anamnese, as recompensas de um exame físico pertinente, o poder de saber como pensar e a importância da responsabilidade; professores que primeiro usem o estetoscópio, não um ecocardiograma, para detectar doenças cardíacas valvulares; professores que utilizem primeiro o oftalmoscópio, não a ressonância magnética, para detectar hipertensão intracraniana; professores que usem primeiramente os olhos, não um aparelho de gasometria, para detectar cianose; professores que primeiro usem as mãos, não a tomografia computadorizada, para detectar esplenomegalia; e professores que sempre usem seus cérebros e seus corações, não uma horda de consultores, para tratar seus pacientes.

 

Precisamos de professores que não solicitem exames caros, de última geração, quando exames mais baratos, convencionais fornecem a mesma informação; professores que não administrem uma série de medicamentos em um esforço para aliviar todo possível doente; professores que valorizem que fazer nada é, às vezes, fazer muito; e professores que percebam que muitos pacientes ficam bem apesar do que fazemos não por causa do que fazemos.

 

Infelizmente, esses modelos de comportamento necessários são uma espécie em extinção. A maioria deles morreu ou se aposentou, e aqueles que ainda têm contato regular com os estudantes de medicina e médicos residentes recém-formados são muito poucos para impedir a maré tirânica daqueles habituados ao uso excessivo de tecnologia médica moderna.

 

Podemos possivelmente reconstituir esses modelos de ensino? Acho que não. Mas, mesmo que pudéssemos, não seria suficiente. Precisamos aproveitar os modelos de comportamento que estão atualmente praticando boa medicina fora da academia. O que esses profissionais vêem e fazem a cada dia tem pouquíssima semelhança com o que os estudantes e recém-formados vêem e fazem na academia. Portanto, boa parte da experiência clínica deve ocorrer no cenário do mundo real, supervisionado por profissionais experientes, compassivos, de bom senso, do mundo real.

 

Desejo fervorosamente que os atuais professores de medicina possam de alguma maneira recuperar o espírito osleriano e esforcem-se diligentemente para restaurar o núcleo verdadeiro de ser médico – o humanismo. Alcançar esse objetivo exigirá professores com compromisso, compaixão, sinceridade e bom senso. Professores que entendam e acreditem que a medicina é um chamado, não um negócio. Professores que consigam olhar, ouvir e conversar com os pacientes. Professores que trabalhem tão duro e o quanto for necessário para garantir o bem-estar dos pacientes. E professores que sempre coloquem os pacientes em primeiro lugar.

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* Artigo traduzido do original em "Hyposkillia: Deficiency of Clinical Skills".Tex Heart Inst J. 2005;32(3):255-7.) Editorial Convidado: Herbert L. Fred, MD, MACP.