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Loucura e Cordura - Marcello Blaya Perez E-mail
Coluna CELPCYRO - Colunistas

 

 

                Os humanos são os mamíferos no topo do processo evolutivo e a grande diferença com seus ancestrais é sua capacidade de simbolizar que lhes permite a palavra, os sonhos, as fantasias e com elas a capacidade artística e cientifica. Dentre humanos e suas artes devemos separar cordatos e malucos.

                Uma das artes mais loucas origina-se no fanatismo religioso que proclama a superioridade racial que os autoriza ou os obriga a exterminar os que não se enquadram no seu credo ou sua raça. A historia da humanidade parece ser a historia dessa intolerância e ela explica a dificuldade de chegar-se a uma convivência pacifica no mundo.

                Jeová é um deus cruel e o Velho Testamento está repleto de exemplos baseados no “olho por olho”. Jesus de Nazaré mostrou que a capacidade de aceitar e perdoar é melhor do que os planos vingativos de Jeová e foi recompensado com a morte na cruz. A Espanha do século XV com seus reis católicos, Fernando e Isabel, prestigiaram a Santa Inquisição e obrigaram judeus e árabes a converter-se ou serem mortos ou expulsos do pais. E diziam-se cristãos!

                Sete séculos depois de Jesus Nazareno, um cidadão árabe, Maomé, inventou ser o ultimo profeta de um deus, Alah, muito parecido com Jeová e no Alcorão podemos encontrar a réplica da Santa Inquisição.

                Mas a história dos povos tem como base a história do indivíduo. Adolf Hitler repetiu a receita de Jeová e dos Reis Católicos agravada pelo fato de não haver conversão e só extermínio. Cada ser humano tem um problema parecido pois, como as moedas, são arianos, católicos ou muçulmanos na cara e na coroa são os odiados inimigos que devem ser expulsos ou exterminados.

As artes mostraram muitos exemplos dessa dualidade: O RETRATO DE DORIAN GRAY (1890), de Oscar Wilde (1854-1900) e MOBY DICK (1851) de Herman Melville (1819-1891). A relação do animal, a baleia branca, com o humano, Capitão Ahab, mostra-nos como entender essa relação.

                O homem é um descendente da fila de animais que começa com os unicelulares como a ameba até chegar a ele. Ao longo desse trajeto de milhões de anos, no homem foi conservado tudo o que era bem sucedido nos seus antepassados e hoje tem um cérebro tripartido: o reino somático é o cérebro dos sáurios; o cérebro do reino emocional é o dos mamíferos e finalmente o cérebro humano, exclusivo dele, capaz da simbolização, que o diferencia dos antepassados.

                Essa capacidade obriga o homem a saber que a morte é seu destino final como é de todos os animais. Mas com sua capacidade criativa ele se recusa a aceitar esse fim e filosofias como a de Platão e as religiões optaram por um corpo cuja única função é servir como portador da alma, essa é a que tem valor pois é eterna, não morre. E quem não aceita a alma, que está vinculada ao deus eterno, precisa ser destruído.

                Baruch Spinoza (1632=1677), judeu de família portuguesa expulsa da Península Ibérica para escapar da Santa Inquisição, foi educado em Amsterdã para tornar-se rabino. Seus estudos concluíram por mostrar-lhe que DEUS É A NATUREZA e as historias do Velho Testamento, metáforas e parábolas fantasiosas. A Sinagoga Portuguesa de Amsterdã expulsou-o da comunidade, como a Santa Inquisição teria feito com eles em Portugal.

                Se reconheço minha condição de animal e humano, a cara e coroa, tenho três opções: 01-expulsar ou negar o animal; 02-expulsar ou negar o humano; 03-aceitar a dualidade e equilibrá--la harmonicamente como Jesus de Nazaré nos ensinou.

                O individuo que opta pelo humano e nega o animal é um carente cuja vida é pobre e sua companhia chatérrima. É a forma de loucura mais frequente.

                O que nega o humano e opta pelos impulsos animais é o louco de hospício. Mas se tem o poder é o político como Gengis Kahn, Napoleão Bonaparte, Hitler, Stalin ou os Reis Católicos.

                Cordatos são os humanos que se reconhecem animais e humanos e têm a capacidade de equilibrar seus impulsos destrutivos, com o outro ou consigo mesmos, graças à capacidade amorosa e tolerante.

                Como profissional tive experiência com os três tipos de pessoas. Nos anos entre 1960-1990, como fundador e diretor da Clinica Pinel, convivi com pessoas das opções 01 e 02. Lembro duas experiências dessa época,

O dia começava na Pinel, de segunda a sábado, com a REUNIÃO DAS OITO. Nela participavam as equipes terapêuticas (médicos, enfermeiras, psicólogos, assistentes sociais), os pacientes eleitos nas unidades e representantes da administração. Durante uma hora revisávamos os acontecimentos das ultimas 24 horas e todas/os tinham o mesmo direito de opinar e sugerir medidas. O paciente representante do seu grupo tinha a oportunidade de ver e sentir que reconhecíamos que junto com sua loucura havia a capacidade cordata. E nos cordatos se podiam apontar mostras de sua loucura, sempre de forma respeitosa em busca da verdade.

A outra mostra dessa dualidade era o paciente-atendente. Nas unidades a porta era fechada a chave e esta ficava com o pessoal da enfermagem. Pacientes eram convidados a desempenhar a tarefa de atendente, auxiliar de enfermagem, e ficavam com a chave e encarregados de controlar as entradas e saídas. Houve um exemplo que nunca esqueço. Antonio, esquizofrênico crônico, era paciente-atendente e uma tarde foi ao enfermeiro chefe e queria entregar a chave. Foi-lhe explicado que seu horário terminava as 18 horas e ele disse: “Senhor Jorge, fique com a chave que preciso louquear.”

                Entre 1990 e 2000 fui contratado pela AJURIS para coordenar o que chamei de GRUPO DE DIÁLOGO. Segundas-feiras depois do expediente reuníamos juizes/as e desembargadores/as, participação voluntária, durante 90 minutos. Pelos DOZE PASSOS inspirados no grupos de Alcoólicos Anônimos, pode-se ver que a observação da conduta do que ocorre no grupo e que os participantes explicam aos demais, substituía o uso da palavra para falar de ocorrências passadas que os membros do grupo não haviam presenciado ou dos planos futuros: a tarefa do grupo era observar o aqui-e-agora pois a conduta é sempre mais elucidativa do que os relatos, as palavras assim limitadas vetam as mentiras fugidias. Ninguém era obrigado a observar os Doze Passos mas ninguém podia evitar a “cutucada” ao fazer isso. E lembro um episodio revelador dos problemas: uma desembargadora veio para a primeira e única participação e ao fim de meia hora se levantou e ao sair disse: “ Vocês são loucos, por isso vou embora!” E eu lhe disse, tem razão, é a nossa loucura que estamos ensinando a tentar conviver com a nossa sensatez!

                No terceiro grupo penso em Buda, Jesus Nazareno, Gandhi, Madre Tereza de Calcutá, Nelson Mandela, Papa Francisco.

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marcelloblayaperez@gmail.com

agosto de 2015