O néctar da vida nas nossas coxilhas | | Imprimir | |
Fronteiras Culturais - Outras Fronteiras |
Carlos Alberto Potoko *
Parece mentira que em nossas coxilhas está brotando a bebida dos deuses - esse sumo extraído como se fora lágrimas de Jesus, agora nasce e exala e perfuma nossos ventos divinamente. Cristo o saboreou cercado por seus apóstolos em despedida de sua vida na terra. Depois tornou-se sagrado, recomendado a todos se deleitarem com ele para solenizar a vida.
Pois não é que esse múnus divino, que desceu dos céus às nossas coxilhas em 1973 (pelo Prof. Harol Olmo, da Universidade de Davis, da Califórnia), mais precisamente no paralelo 31 - o mesmo paralelo de super produtores dos melhores vinhos, como o chileno, argentino, australiano e sul-africano - está vingando! Dizem os especialistas que o principal da nossa região é a sua continentalidade que, aliada a uma atmosfera límpida, leva a diferenças maiores entre as temperaturas extremas, acumulando aí uma maior insolação e assim tende a produzir uvas com mais açúcar, característica de um terroir (significa originalmente uma extensão limitada de terra considerada do ponto de vista de suas aptidões agrícolas, particularmente à produção vitícola). A "terroir" é um grupo da vinha ‘ou mesmo vinha’ da mesma região, pertencente a uma denominação específica, e partilha o mesmo tipo de solo, condições climáticas e vinificação savoir-faire que contribui para dar a sua específica personalidade ao vinho.
E, nesse sentido, os melhores Tannat do mundo, ricos em tanino são produzidos no paralelo 31, região que cientistas apontam para o papel do resveratrol, um composto encontrado na casca das uvas vermelhas, estas saudadas durante muitos anos como uma espécie de substância milagrosa. O resveratrol é um composto que, segundo os cientistas, poderia retardar o envelhecimento e combater o câncer e a obesidade. Embora alguns cientistas concordem que o consumo moderado deste vinho possa ajudar a proteger o coração, reduzir o colesterol "ruim" e prevenir o entupimento das veias e artérias. Há divergências por outros cientistas sobre o que está por trás desses benefícios, contudo até o momento, estudos feitos em laboratório revelaram resultados animadores com testes em cobaias. Mas num quesito todos concordam, bebê-lo moderadamente alimenta a alma e o coração.
Ao participar com amigos, na Cooperativa Aliança, da nova configuração dos vinhos Santa Colina para CERRO da CRUZ, lançamento este que será épico e está previsto para início de 2014, não tive mais dúvidas: nosso vinho atingiu a excelência em qualidade. E assim se consagra, no silêncio secular do Cerro da Cruz, uma das principais elevações montanhosas da coxilha de Sant’Ana, com 392 metros de altura, denominação esta dada pela cartografia geral do Exército baseada nos causos de guerra em que moradores da localidade contavam que viam nele uma cruz que aparecia e desaparecia no seu crepúsculo. É uma cicatriz da terra e da história fronteiriça que testemunhou guerras por demarcações, revoluções e paz. Ver brotar agora a vida, como num Éden aos seus pés, videiras amanhadas para servir a mesa e a alma deste amado chão, é uma benção. Quem o visita faz parte – e uma parte feliz – do quotidiano mais autêntico desta região: a boa mesa aveludada com causos enternecedores regados com um vinho terroir que coloniza as narinas do coração. Neste quadro, nascer e viver nesta fronteira é saborear a vida sem fronteiras, isso porque, as melhores coisas da vida são grátis. Elas vêm em forma de simples prazeres e surgem mesmo à nossa frente em locais e momentos inesperados. São regidas pela mãe natureza e capturadas pela nossa consciência presente. É tudo uma questão de parar um momento e observar, na cor dos cachos das uvas ao sol em contraste com o céu das nossas coxilhas, para juntos, de mãos dadas com alguém que se ama, brindar por nossa Sant’Ana do Livramento.
-------------------------- *Poeta e cronista, colaborador do site CELPCYRO
|